Sonny Boy é um grande achado em meio a tantas obras lançadas anualmente na indústria de animes e mangás, a série mesmo antes de seu trailer gerava uma grande expectativa naqueles que conheciam os nomes por trás do projeto, contando com a direção e roteiro de “Natsume Shingo”, conhecido por dirigir One Punch Man (2015) e Boogiepop wa Warawanai (2019) e o character design de “Eguchi Hisashi”, responsável pelos personagens do belíssimo Perfect Blue (1998), o anime era a esperança de muitos que aguardavam por um novo clássico, ou algo diferente de tudo que estávamos recebendo na última década, e felizmente posso dizer que as preces foram atingidas.
Analisar esta série é um desafio, após uma semana de seu término ainda estou perdido em meio a tudo que vi, não de uma forma negativa, muito pelo contrário, Sonny Boy se encaixa naquilo que eu considero a mais pura expressão da palavra ARTE! Já passou pela sua cabeça a seguinte questão: “Como avaliar isso que vi? Quais são os critérios ou méritos que devo atribuir à obra?" Pois foi o que senti ao assistir esse anime, acompanhá-lo foi uma experiência única em vida, não só pelo que ela entrega mas também pelo momento em que vivemos.
Foi-se a época onde certas obras ficavam isoladas em seu nicho, e aqueles que conversavam a respeito dela era sempre a mesma bolha, Sonny Boy nasceu em meio a era digital e está disponível para que todos o apreciem e debatam, foi incrível ver a primeira impressão de muitas pessoas com um anime de tamanho calibre, alguns perdidos, outros maravilhados, e também aqueles que o rejeitaram logo de cara por ser totalmente fora da zona de conforto.
“Mas o que é Sonny Boy?”, talvez seja o que muitos que vieram ler este texto buscam saber, devo lhes dizer meus amigos que isso também não deve ser dito em palavras, pois seria crueldade com uma obra tão complexa fazê-lo, mas, o que eu posso contar é a minha experiência com o anime e o que eu pude tirar de proveito dele.
Sonny Boy é sobre crescer, amadurecer, olhar para si mesmo e lidar com a vida, o anime em nenhum momento tenta lhe entregar todas as respostas, na verdade abusa do “show, don’t tell”, termo que se refere a obras que conversam com o telespectador visualmente, tratando-o com o máximo respeito, ao pressupor que ele pode decifrar seus enigmas visuais e simbolismos sem que seja carregado pelas mãos.
A todo momento, temos algo na tela que tenta dialogar com nosso interior, não necessariamente de forma objetiva, esperando que nós saibamos exatamente o que o diretor quis passar com aquelas cores, ângulo de câmera ou elementos em cena, mas de forma completamente pessoal. Você pode tratá-las apenas como o seu coração se sente ao vê-las, ou pode tentar racionalizá-las em busca de todos os significados possíveis, eu recomendo uma união entre as duas coisas para que a obra cresça ainda mais dentro de você.
Os cenários são um deleite aos olhos, apesar de simples e às vezes com proporções propositalmente distorcidas, são sempre parte intrínseca da cena, a composição deles foi feita de forma que dialogasse não só com os personagens mas também conosco, é difícil encontrar alguém que não ficou boquiaberta quando as transições de cenas bruscas passaram a ser frequentes, mudando todas as cores de fundo ou ambiente em que nossos personagens se encontravam, dando um tom totalmente diferente das cenas.
A trilha sonora (ou falta dela) não fica para trás, eu costumo dizer que o silêncio é o som mais difícil de se lidar, e Sonny Boy sabe disso, em boa parte dos episódios não temos nada além do som ambiente, o que gera um sentimento de solidão e confusão, que condiz muito com o que os personagens estão vivenciando. Os mais atenciosos irão reparar que, conforme aquele enigma chamado “outro mundo” é resolvido e os personagens evoluem, a trilha se faz cada vez mais presente, um detalhe pequeno, mas que agrega muito a sua progressão. Um indie rock de primeira, que novamente, conversa conosco, tanto a letra quanto melodia escolhida para cada música está lá para dizer algo importante, principalmente aos jovens.
E falando em jovens, falemos dos nossos personagens, que são riquíssimos, todos estão de certa forma perdidos em suas vidas, é notável que se protegem atrás de suas personalidades fortes ou seus hobbies, veja, não irei descrevê-los um por um, mas para resumi-los, eles são nós, “Natsume” fez um ótimo trabalho quando estava os escrevendo, são a personificação do que a maioria das pessoas passam pela adolescência ou período de juventude adulta, em diversos momentos eu me vi em tela, com alguns amigos e conhecidos ao lado, e me perguntava se mesmo no mundo real, nossas atitudes são diferentes desses personagens fictícios perdidos em uma realidade paralela. Creio que por mais que não estejamos viajando entre mundos diferentes, não estamos tão distantes de sermos Nagara ou Mizuho, mesmo sem a habilidade de criar cópias de objetos ou pular entre mundos diferentes.
Sobre estar "À Deriva", termo usado corriqueiramente pelos personagens para se referir a sua situação atual na qual se encontram, acredito que é a metáfora mais óbvia e objetiva da série, um paralelo com a sensação de não pertencer, não ter destino ou vontade, o grande mal que sofremos hoje. Mas o que me chama mais atenção é que mesmo quando estamos em nosso conforto (no mundo real), temos receio de nos mover para sair dessa zona de solidão, porém, caso acontecesse conosco o mesmo que ocorreu com aqueles em Sonny Boy, ficaríamos tão desesperados para voltarmos ao estado normal das coisas quanto eles, o que me leva a grande questão com esse texto: Você se sente À Deriva? E caso fosse teleportado para outro mundo como eles, o que faria? Acho que aquilo que difere personagens como Nagara e Asakaze, é a forma como vemos as coisas, aquilo que pode ser desespero e um problema a ser resolvido para muitos, pode também ser para outros, a oportunidade de amadurecer e se encontrar.
Sonny Boy é sobre juventude, é sobre saltar de uma realidade para outra até encontrarmos nosso reflexo e encará-lo sem medo, é sobre seguir uma bússola para um caminho desconhecido que só teremos certeza de que valeu caso tentemos, não quero avaliar a obra com notas, ela está acima da ideia de ser avaliada a partir de um número de estrelas, Sonny Boy é a mais pura arte e deve ser experimentada por todos.
Solid_Mateus
Mateus, amante de Cinema Alternativo, Filme B, Exploitation, e o maioir defensor de diretores odiados pela crítica especializada. Nas horas vagas sou Otaku, mas isso é segredo.
Cargo: Escritor
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